sábado, 19 de junho de 2010

Carta Xavante ao Acampamento Revolucionario Indígena

Carta Xavante ao Acampamento Revolucionario Indígena


Podem dar continuidade à luta porque nós aqui estaremos apoiando. Estamos conscientes de que vocês estarão lutando até ser atingida a realidade que nós queremos. E queremos que vocês se lembrem de nossos ancestrais que estarão nos ajudando na hora do perigo. Queremos apoiar a todas as pessoas que lutam por nossos direitos, para que continuem nos apoiando, e que isso aconteça com respeito ao que nos deixaram nossos ancestrais. E a luta não acaba aqui, temos que lutar pelo nosso futuro criança, pela lembrança, a verde mata ligada ao universo. Temos que pensar ao que vamos deixar aos que vem depois de nós.



Na nossa comunidade a maioria de nós não fala português, os velhos temem que as crianças não falem mais nossa língua nativa. Lutamos pela nossa cultura, para que continue existindo. Nós não queremos o mesmo que o branco quer para ele nem o que o branco quer para nós, eles querem que paguemos impostos e vivamos como eles querem. Mas a nossa cultura vale mais do que todo o dinheiro, entoamos o grito lançado por nossos ancestrais na mata. A água e a mata pedem socorro.



A água do rio que ainda bebemos pede socorro. A mata que ainda nos traz a saúde e o alimento, e que usamos de acordo com a tradição também pedem socorro. Estamos lutando junto com o grito de nossos ancestrais.



O mundo do branco tem de entender que nós compartilhamos o espaço para ser respeitado, para que a nossa cultura seja respeitada. A nossa luta não é só por um povo, mas pela humanidade, cuidamos das árvores que trazem o ar puro para todos os brasileiros. Mas o desrespeito é tão grande que ninguém mais se reconhece, as pessoas estão ficando alheias umas das outras. Os empresários não estão pensando nisso.



Mas se formos uma nação, vamos dar as mãos porque somos um povo, uma sociedade, que luta pela vida de todos. O que vale é a vida, a sobrevivência, não o preconceito. Dizemos não à discriminação. Que não se dê mais continuidade à miséria em que estamos. Não devemos pensar pensar que os que estamos neste país devem seguir matando e discriminando. Temos que nos ajudar para lutar pela liberdade, não contra nós mesmos. Enquanto nós ficarmos lutando contra nós mesmos os que querem tirar proveito acham bom.



Aqui, seja branco, negro, japonês ou o que for, nossa luta é pela harmônia entre todos. Não defendemos os ricos, mas o direito de todos, e queremos continuar sendo como somos, povo nativo, e ser valorizado como tal.



Não estamos originando conflitos com políticos e fazendeiros, são eles que estão gerando esse conflito com a gente porque não nos deixam viver em paz, de nosso jeito. Que haja respeito a cada nação.



Nossa preocupação faz com que nossa luta seja no sentido de manter nossa liberdade e nossos direitos, para que o povo indígena não seja mais tratado como criança, somos adultos, temos filhos, netos e queremos ser tratados como tal. Chega de nos dar tapa na cara como fazem com suas crianças. Está na hora de que os indígenas sejamos respeitados como pessoas que somos. Nossa luta é para todos.



Onde vamos beber? Onde vamos pescar? Onde vamos caçar? Cuidamos do meio ambiente. Um dono não bate em seus animais domésticos, mas os indígenas somos tratados pior do que eles.



Todos somos seres vivos, como seres humanos, somos seres vivos, todos queremos sobreviver. Levantamos a bandeira da paz, não queremos a guerra. Nenhum de nós está atrapalhando a vida das pessoas na cidade, estamos vivendo em paz em nossa comunidade, fazendo nossas danças.



Queremos parabenizar a luta dos acampados, sabemos que pensam em nós e em todas as comunidades, lutam por todos.



Que o Presidente da República e o Ministro entendam que somos um povo, nenhum deles sequer esteve na Terra Indígena. Devem nos respeitar, trazer aquilo que seja válido para a comunidade, que os políticos tenham essa compreensão para que não aconteça mais esse desrespeito e etnocídio com as comunidades indígenas.



Carta escrita pela Comunidade Indígena

A’uwê Aldeia Belém

Terra Indígena Pimentel Barbosa

1 comentários:

Cesar Crash disse...

Muito obrigado pelo elogio. "Muito lúcido", nunca vou me esquecer. Justo eu, que todos parecem considerar que vivo em uma dimensão paralela! Amo o pensamento indígena, tenho amigos índios aqui onde moro, temos pensamentos políticos em comum. Ambos somos incapazes de compreender a organização secular da sociedade jurua, incapazes de entender as fronteiras que separam os povos, o conjunto de regras que garantem que quem tem tenha cada vez mais, às custas de quem nada tem. Divergimos apenas no próprio conceito de nação, pois sinto um certo nacionalismo da parte deles. Que o povo indígena nunca deixe de resistir, para que não deixe de existir! Que nhanderuete vos proteja!

19 de junho de 2010 às 18:10

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